Por que os astronautas são mais velhos.
Há muitos anos, uma brasileira que trabalhou na NASA foi entrevistada por Jô Soares em seu programa (ainda no SBT). Um dos pontos mais interessantes da entrevista foi a explicação dada pela especialista sobre a sensação de invulnerabilidade típica dos jovens: quase sempre mais fortes, saudáveis e resistentes que os adultos mais maduros, além de muito movidos pelo natural desejo de descoberta - e um bocado inexperientes - sua percepção um tanto equivocada sobre si mesmos pode levá-los a comportamentos de risco que comprometem sua própria segurança - e a dos outros.
Seria essa, portanto, uma das causas de os astronautas, em geral, terem mais de 30, 40 e até 50 anos de idade. Além de uma longa e exigente formação para conquistar o posto (sobre esse tema é interessante assistir a um filme dos anos 1980 chamado “Os Eleitos”), numa complicadíssima e arriscadíssima empreitada no espaço - como são todas - em que cada gesto é cuidadosamente calculado, não há lugar para o ímpeto e para a falta de cautela. Um descuido e a missão pode se tornar um grande fracasso, talvez uma tragédia.
Essa sensação de invulnerabilidade não é, evidentemente uma característica sempre exclusiva dos jovens, mas nenhum profissional respeitável da área de comportamento/neurociência discordaria de que ela é estatisticamente prevalente entre eles. Ou seja, ao selecionar aleatoriamente alguém na multidão, se a pessoa for muito jovem existirá uma probabilidade muito maior de que ela seja, digamos, perigosamente audaciosa. É da vida, e é necessário.
Necessário porque a tendência a subestimar o risco e superestimar a própria capacidade de lidar com situações difíceis também é, muito provavelmente, uma das causas da inovação. Claro, ela leva a fracassos e sucessos, mas é assim mesmo que a civilização e a tecnologia avançam (numa perspectiva otimista).
A famosa “zona de conforto” (bem menos nociva do que se pinta, e indispensável em certas fases da vida) dificilmente leva a mudanças significativas. A busca pela zona de conforto (na qual se sente com mais profundidade o prazer de uma realização) leva as pessoas a agir, mas acomodar-se nela tem grande chance de levar à estagnação. E aqui tocamos com mais profundidade o terreno da neurociência, que se dedica a compreender como o cérebro processa informações e toma decisões.
Compreender padrões de comportamento aplicando neurociência (de forma intencional ou não) já ajuda as corretoras e seguradoras a oferecer as soluções mais adequadas às necessidades do cliente. Outra aplicação, está no segmento de seguros corporativos, é a análise de risco, uma vez que é preciso avaliar a relevância dessa variável para cada cliente antes de propor uma cobertura adequada: a neurociência ajuda a entender como fatores emocionais/cognitivos afetam o comportamento do cliente em relação ao risco. Claro que fatores técnicos e totalmente objetivos também entram (muito!) na análise.
O que pretendemos destacar aqui é que, como diversos estudos neurocientíficos demonstram, boa parte das pessoas tendem a subestimar a probabilidade de eventos negativos, como um acidente ou uma doença grave. Diante da dificuldade psicológica de lidar com as duras consequências e/ou o sofrimento causados por esses eventos, a mente refugia-se em algum ponto em que ainda existe aquela sensação de invulnerabilidade do jovem: “até hoje eu me dei bem, isso não vai acontecer comigo...”
Cria-se, assim, uma zona de conforto ilusória (mas, claro, perceptivamente “confortável”), em que a ausência de eventos negativos passados ou presentes leva o decisor a tornar-se descuidado. É tudo que um imprevisto precisa para causar suas piores consequências: alguém total ou parcialmente desprevenido, de guarda baixa, que acreditava que os ventos da fortuna soprariam sempre a seu favor e agora fica totalmente desorientado. Uma atitude muito compreensível e humana (talvez a mais fácil), mas bastante contraproducente.
Na liderança de um negócio, no mundo corporativo, a ascensão de uma empresa - muitas vezes meteórica - pode depender da inovação que é fruto da audácia (bastante relacionada à sensação de invulnerabilidade), mas a sobrevivência a longo prazo depende de estar... seguro. Ou seja, de assumir atitudes altamente técnicas, cuidadosas, de tomar decisões com base na experiência, na maturidade e no cuidado.
Pensamentos e ações exaustivamente calculados, e que priorizam a cautela - como os de um astronauta em uma missão crítica espaço.
Fontes
www.forbes.com.br
www.segs.com.br
www.infomoney.com.br
www.einvestidor.estadao.com.br