Burnout existe?

No passado recente, uma conhecida jornalista da maior rede de televisão do país saiu do ar – e depois da empresa – alegando ter a síndrome de burnout (ou Burnout, com inicial maiúscula). Na época, como ainda hoje, muitas pessoas classificam o quadro como “mimimi”, reclamação infundada de alguém que não é suficientemente competitivo, incompetência mascarada ou simplesmente algum tipo de malandragem para trabalhar menos.

Essas pessoas estão enganadas: a síndrome existe, pode ser grave e desestruturar seriamente, às vezes para sempre, a vida e a carreira de quem a apresenta. Uma busca rápida na Internet demonstra que a existência e gravidade do problema são praticamente consensuais entre os profissionais de saúde, inclusive alguns bem famosos. Sem contar que está descrito na literatura especializada e registrado na CID (Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde).

“Burnout” pode ser livremente traduzido como “totalmente consumido”: algo ou alguém que gastou todo seu combustível ou sua energia. Em outras palavras, esgotamento total. O transtorno é caracterizado por um estresse devastador, extremo, superior à capacidade pessoal de lidar com questões do dia a dia de modo eficiente e… está relacionado exclusivamente ao trabalho.

Profissionais que atuam diariamente e por tempo prolongado sob pressão e com responsabilidades constantes estão mais propensos a apresentar a síndrome: médicos, enfermeiros, professores, policiais, jornalistas etc. Os sinais e sintomas são tanto psicológicos e emocionais como físicos. Entre os principais, estão:
– Cansaço excessivo, físico e mental;
– Dor de cabeça frequente;
– Alterações no apetite;
– Insônia;
– Dificuldade de concentração;
– Sentimento de fracasso, insegurança;
– Negatividade constante e desesperança;
– Alterações repentinas de humor;
– Isolamento;
– Alteração da frequência cardíaca;
– Aumento da pressão arterial;
– Dores musculares;
– Problemas gastrointestinais.

Ao ver essa lista, muita gente pode pensar: “então eu já tive ou tenho Burnout”. Mas esse raciocínio não é correto. Apenas um desses sintomas, ou a ausência de algum deles, não caracteriza ou descaracteriza a síndrome. É preciso levar em consideração diversos fatores, como há quanto tempo se apresentam, como evoluíram e as circunstâncias de vida do paciente. O diagnóstico precisa ser feito por um profissional especializado – normalmente um psicólogo e/ou psiquiatra – que também conduzirá o tratamento.

A primeira frente de tratamento costuma ser a psicoterapia, mas dependendo da severidade do quadro pode ser necessária a prescrição de medicamentos, como antidepressivos e ansiolíticos. Normalmente, a melhora se apresenta entre 1 e 3 meses, mas, claro, o ritmo é muito individual. Durante e depois, é fundamental que o ritmo de trabalho e o envolvimento com a atividade profissional sejam reavaliados e adequados de modo a manter o bem-estar do paciente.

Pode parecer estranho, mas também é possível prevenir a síndrome de burnout. Como? Deixando de ver o trabalho como um objetivo em si mesmo e incluindo definitivamente na vida (com o valor que merecem) atividades como a convivência com amigos e familiares, relaxamento, lazer, atividade física regular. O que, aliás, parece ser uma postura de vida de grande eficiência preventiva para promover e manter a saúde de todos nós, seres humanos.

Fontes:
http://antigo.saude.gov.br
https://www.uol.com.br/vivabem
https://www.tuasaude.com


HOME-OFFICE DÓI?

Dores nas mãos, nos braços, nos ombros, no pescoço: profissionais de saúde têm constatado um número crescente de pessoas com essas queixas desde… o início da pandemia. Estima-se que esses sintomas são resultado direto da postura inadequada e do excesso de tempo em frente a telas e teclados, consequência da mudança emergencial para o home-office sem cuidados com a ergonomia.

Boa parte – talvez a maioria – dos profissionais que precisaram repentinamente migrar para o home-office não tiveram tempo e recursos para se preparar de forma adequada, fazendo as adequações necessárias no “novo” ambiente de trabalho, que além de tudo também se tornou híbrido com o ambiente doméstico, com todas as facilidades e interferências que isso pode trazer.

Alguns empregadores até contribuíram para aquisição de equipamentos, como cadeiras ergonômicas, mas casos assim foram, e parecem continuar sendo, raros. Só que a ergonomia não pode ser subestimada, nem para a saúde do profissional, nem para a produtividade da empresa para a qual ele trabalha. Além do inerente componente humano (outro elemento ainda relativamente raro no mundo corporativo), já é bem sabido, há décadas, que saúde, bem-estar e desempenho estão intimamente relacionados.

Um exemplo, simples e clássico: o recomendado é que o centro da tela fique na altura dos olhos, mas como a maior parte das pessoas utiliza notebooks, sem qualquer adaptação, o monitor acaba ficando bem abaixo do ideal, fazendo que o pescoço permaneça dobrado para a frente e sobrecarregando a coluna cervical.

Como a “improvisação” se estendendo já há mais de 1 ano (o que soa como algo, de fato, permanente), os problemas relacionados à inadequação ergonômica começaram a aparecer com frequência cada vez maior: em mais gente, de mais empresas, por mais tempo. E nem falamos aqui da queda drástica no nível de atividade física…

Não parece mais adequado esperar o retorno à normalidade do trabalho presencial, que pode não acontecer tão cedo, ou, para algumas empresas, nem acontecer – já que muitas podem olhar exclusivamente para a redução de custos (menos escritórios e gastos com deslocamento e alimentação da equipe), numa atitude imediatista e predatória que acaba afetando seus próprios resultados a médio e longo prazo.

É preciso que profissionais e empregadores saibam, e aceitem: nosso corpo é, entre outras coisas, um complexo conjunto de forças musculares e fenômenos sensoriais uma mudança, na ação de um só músculo, resulta na reorganização inevitável de todo esse conjunto, para o bem ou para o mal. Perceber e tratar com cuidado da postura que assumimos quando trabalhamos é um dos aspectos mais profundos e essenciais da experiência humana.

Fontes:
https://www.brasilmedicinaocupacional.com.br
https://6minutos.uol.com.br


Ter depressão não é o mesmo que estar deprimido.

Já vimos que o isolamento social imposto pela pandemia tem tido efeitos preocupantes sobre a saúde das pessoas, inclusive a saúde mental. Quadros como bruxismo – abordado em artigo anterior – insônia e depressão vêm aumentando significativamente na população brasileira.

Embora existam números, a contabilidade real de quanto esses quadros aumentaram será feita por estudiosos e estatísticos nos próximos anos. É preciso ter certa distância temporal para ver um cenário tão novo com clareza. Mas a percepção de especialistas da área de saúde mental, consolidada em inúmeras entrevistas e matérias jornalísticas, já constitui um indício bastante confiável.

A atualidade do tema é um bom motivo para fazer uma distinção necessária entre o uso popular da palavra “depressão” (como em “bateu uma deprê” ou “estou deprimido”) e a definição médica desse mal. A tristeza ou melancolia transitória, causada ou não por um evento real (como a perda de um amor, um ente querido ou um emprego), é bem diferente da depressão “doença”, um estado mais persistente, profundo e debilitante, que pode comprometer severamente vários aspectos da vida da pessoa.

Embora se saiba que certamente há um componente genético, existem grandes debates, particularmente nas áreas de psicologia e psiquiatria, sobre as causas da depressão. Há os que acreditam que ela acontece por um desequilíbrio químico no cérebro e há quem afirme que esse desequilíbrio não é a própria doença, mas um de seus sintomas. Parece, contudo, haver um razoável consenso de que, se a depressão se manifesta, por um motivo ou por outro esse desequilíbrio está lá – e precisa ser tratado.

Uma das dificuldades que aqueles que sofrem com a depressão ainda enfrentam é o preconceito contra a doença. Se uma pessoa tem diabetes e precisa de insulina, ou sofre de hipertensão e tem de tomar remédios para controlá-la, dificilmente alguém ficará dizendo para o paciente: “não se entregue”, “seja forte”, “reaja”. Sim, isso ainda acontece quando se trata de depressão, e no melhor dos casos é fruto de desconhecimento.

Assim como o pâncreas para o diabetes e o sistema circulatório para a hipertensão, o cérebro – onde pode-se dizer que depressão “acontece” – é um órgão. Provavelmente o mais nobre e sofisticado deles, mas ainda assim um órgão (daí organismo = conjunto de órgãos). Cuidar de um órgão doente não é algo que se pode supor que dependa de “caráter” ou “força de vontade”.

O que existe e funciona é um tratamento, que normalmente é multidisciplinar e pode envolver psicoterapia, mas certamente envolverá, para grande parte dos pacientes, medicamentos – e aqui não pode haver preconceitos (lembra-se da insulina?). Também é uma estratégia valiosa adotar uma razoável rotina diária, com “tarefas” (coisas a fazer), e muito, mas muito importante praticar atividade física. É indispensável, claro, a orientação de um psiquiatra (que não é quem cuida de loucos, mas um médico que estudou muitos anos para tratar do cérebro).

Todo o tratamento é individualizado, pensado para “equilibrar” a química do cerebral, estabilizando o nível de neurotransmissores – substâncias responsáveis pelas reações químicas que fazem o cérebro funcionar – com o objetivo de restabelecer o humor e o comportamento “normal” do paciente (como ele era antes da depressão se apresentar). Assim como o assunto, as possibilidades são vastas, e não é possível esgotá-los em 1 ou 2 blogs, por isso devemos voltar ao tema em breve.

Por enquanto, tente se lembrar: a depressão pode ter como gatilho um fato que para boa parte das pessoas traria tristeza passageira, mas para quem tem a doença acaba abrindo uma porta, uma janela de oportunidade para sua manifestação. Um bom parâmetro: uma mistura de desmotivação e tristeza que dure mais de 3 meses provavelmente não é só uma pessoa “na bad”, mas um caso de depressão. Se for com você, ou alguém próximo, tente ver como tal. Procure ajuda especializada.


Entenda como o home office pode afetar sua saúde mental.

A pandemia de covid-19 obrigou as empresas a se adaptarem a uma nova realidade, tendo o trabalho em home office como uma das principais mudanças observadas. Embora muitas empresas tenham se mostrado entusiastas do trabalho online nos meses iniciais do isolamento imposto pelo covid-19, algumas delas já planejam o retorno de parte das atividades para o modelo presencial.

O impacto que o trabalho em home office teve na saúde mental dos trabalhadores foi o tema de uma pesquisa publicada em março de 2021 no Journal of Occupational and Environmental Medicine. Foram observados um declínio na saúde física e mental dos indivíduos que responderam ao questionário online e fizeram a transição para o modelo online. Os resultados mostraram que houve uma relação entre a piora da saúde física e da saúde mental, e os principais fatores estressores encontrados foram mudanças de hábitos alimentares, dos relacionamentos sociais, problemas de comunicação com os colegas de trabalho e aumento de distrações durante o horário de trabalho. Pessoas com crianças pequenas em casa, por exemplo, relataram piora dos sintomas se comparadas com os lares que continham apenas adultos e adolescentes.

Os autores do trabalho comentam: “Existem inúmeros fatores que podem impactar positivamente na saúde dos trabalhadores que estão em home office (…) como ter um espaço dedicado para o trabalho, ter um local ergonômico, conhecimento da plataforma de trabalho…”. Infelizmente, a realidade brasileira mostra que muitos trabalhadores não têm possibilidade de seguir as recomendações citadas, o que pode levar a um aumento dos sintomas ansiosos e depressivos, como a síndrome de burnout.

É fundamental que os profissionais de saúde, líderes de equipe e gestores tenham um olhar para a saúde mental dos trabalhadores. O reconhecimento dos sinais iniciais e as estratégias de manejo são abordadas nos cursos de Pós-Graduação Lato Sensu da FCMSCSP.

Fonte:
Dr. Victor Otani
Professor Instrutor – Departamento. de Saúde Mental – Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de SP


Bruxismo é mais comum do que você pensa.

Há um problema de saúde que atinge muito mais gente do que se pensa e se manifesta tanto durante o sono como na vigília: o bruxismo, que pode ser definido uma atividade muscular mastigatória repetitiva e involuntária sem relação com a alimentação. Em outras palavras, é o ato de ranger os dentes sem querer, que em parte dos casos pode não ter consequências, mas comumente provoca outras disfunções.

O problema não tem uma causa totalmente definida, mas especialistas associam sua incidência tanto a estresse, ansiedade e depressão como ao consumo de certas substâncias: café, álcool, cigarro, alguns medicamentos e drogas recreativas. Também parece existir um componente genético importante, uma vez que a história familiar é um dos fatores que, estatisticamente, predispõem ao bruxismo.

Estima-se que nada menos de 40% dos brasileiros apresente bruxismo, e os profissionais da área alegam ter notado um aumento da incidência na pandemia. Ou seja, é provável que esse problema de saúde esteja aí, na sua empresa, comprometendo a saúde da sua equipe, talvez indiretamente provocando absenteísmo.

Por ocorrer também em crianças, houve tempo em que o bruxismo foi considerado uma fase “natural” da infância. Hoje se sabe que, embora realmente exista uma fase de instabilidade da mandíbula, a qual deverá se acomodar durante o crescimento e a maturação neurológica, o bruxismo infantil pode ser o prenúncio de um problema que vai também acontecer na fase adulta e provavelmente durar a vida toda.

E há também especialistas que associam a ocorrência de bruxismo ao bullying… Pode-se tirar, portanto, uma conclusão válida para todos os casos: assim que o bruxismo se apresentar, em qualquer idade, é preciso procurar orientação especializada e investigar as causas, pois é claro que, quanto mais cedo for iniciado o tratamento, melhor.

Embora a manifestação mais comum do bruxismo seja o ranger de dentes, apertar e bater os dentes também compõem o quadro. No bruxismo do sono, se não há sintomas dolorosos no dia seguinte, é comum que o problema só seja notado por um parceiro de quarto ou numa visita ao dentista – feita por outros motivos – quando já há desgaste dentário.

No bruxismo em vigília, acontece mais ou menos a mesma coisa: se a pessoa não sente dor, apesar de estar rangendo os dentes ou contraindo a mandíbula sem motivo, muitas vezes nem percebe que o problema existe – mas, dependendo da intensidade, o dano pode ser tão grave quanto.

Embora não seja exatamente “perigoso”, se não for tratado o bruxismo pode causar desgaste dental excessivo, dor nos dentes, lesões dentárias irreversíveis – como fraturas – além de dor importante nos músculos faciais, na articulação temporomandibular (que liga a mandíbula ao crânio) e cefaleia (dor de cabeça). Como não existe cura, o tratamento tem o objetivo de neutralizar os fatores desencadeantes e preservar a integridade dentária com o uso de placas amortecedoras, normalmente de acrílico.

Tudo começa, portanto, com uma boa consulta ao dentista, assim que o problema for identificado – e antes que haja danos permanentes. 

Fontes:
www.abo.org.br
www.uol.com.br/vivabem
www.tuasaude.com/bruxismo
www.einstein.br
www.apcd.org.br


O home-office sobrevive sem aquele cafezinho?

Os efeitos nocivos do home-office – particularmente seus excessos – imposto a grande parte das pessoas por causa da pandemia já foi bem explorado por inúmeras matérias jornalísticas focadas em saúde. Muita gente já leu ou ouviu falar dos principais problemas que vêm sendo apontados por especialistas: sedentarismo, má postura e alimentação, falta de exposição ao sol (necessária para sintetizarmos vitamina D), invasão da rotina doméstica no trabalho (e vice-versa), além de ansiedade e depressão, provavelmente causados pela questão principal – a falta de socialização.

Uma pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz sobre o impacto do isolamento social mostrou que sintomas de ansiedade e depressão têm afetado 47,3% dos trabalhadores essenciais no Brasil durante a pandemia, sendo que mais da metade dos afetados (27,4% do total de entrevistados) sofre de ansiedade e depressão ao mesmo tempo. Além disso, 44,3% têm abusado de bebidas alcoólicas, 42,9% sofreram mudanças nos hábitos de sono e 30,9% foram diagnosticados ou se trataram de doenças mentais no ano anterior.

Ocorre que a crise sanitária global está demonstrando o que muitos já sabiam, e quase todo mundo intuía: a interação ao vivo, sem mediação da tecnologia digital, é tão ou mais importante para a saúde do indivíduo – e, portanto, para a produtividade da empresa – quanto exercitar-se, alimentar-se bem, ter boas noites de sono. A percepção imediata do outro, suas expressões faciais e corporais, e a resposta igualmente imediata a estímulos interativos não podem ser substituídas por algo como competência profissional ou domínio da tecnologia.

Fazer um comentário divertido e observar a reação na expressão do colega, de forma instantânea e ao vivo, opinar espontaneamente e sem hora marcada sobre um trabalho em andamento ou tomar um cafezinho junto são experiências impossíveis de reproduzir on-line e, parece cada vez mais evidente, indispensáveis para uma atividade profissional saudável e equilibrada. E vale a pena elucidar 2 pontos pouco ou quase nada comentados nas matérias sobre efeitos nocivos do home-office…

Ponto 1: diferente do uso popular, tecnicamente virtual não é o contrário de real, mas sim de presencial – uma vez que a interação virtual, como existe, também é real, tanto que em excesso pode comprometer a saúde. Ponto 2: o olho humano é muito mais exigido na visão de luz irradiada, como a das telas, do que na de luz refletida, como a dos livros. Então, também por isso, interagir só pela tela do computador “cansa mais” e há evidências que sugerem que a leitura é 25% mais lenta e a compreensão mais superficial.

Aos gestores de negócios e decisores sobre benefícios corporativos relacionados à saúde compete refletir: será mesmo sustentável (e humano) manter o trabalho remoto como regra dominante depois da pandemia? Existem práticas que podem ser estimuladas para reduzir o impacto do home-office excessivo sobre a equipe, preservando a saúde dos indivíduos e da empresa – resultado do esforço coletivo – até que vençamos a pandemia? A resposta não está pronta, mas tudo indica que só pode residir na valorização do bem-estar das pessoas.

Fontes
https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude
https://www.uol.com.br/vivabem


Junho Vermelho: por essa causa vale a pena dar o sangue.

Poucas expressões significam com tanta intensidade o ato de fazer algo por alguma coisa quanto “dar o sangue”. Dizer que alguém deu o sangue por determinado objetivo pode transmitir, por um lado, um tremendo empenho, e, por outro, um grande desprendimento. Às vezes, talvez muitas, a expressão nem é figurativa, mas literal. Não é tão difícil achar na história exemplos de indivíduos que derramaram seu sangue – sangue mesmo – por uma causa.

Pois a vida moderna consegue dar à expressão uma terceira acepção, sem excluir as outras, e talvez até mesmo reforçando-as: generosidade. Não é essa a força motriz que leva alguém a doar o próprio sangue para preservar a saúde – e frequentemente salvar a vida – de outra pessoa? A ciência permitiu que isso seja feito com segurança nos dias de hoje.

A data de 14 de junho foi definida pela OMS como Dia Mundial do Doador de Sangue, que acabou se desdobrando para o chamado Junho Vermelho, mês todo dedicado a lembrar o valor e a importância da doação de sangue, assim como para estimular sua prática contínua. O dia e o mês foram definidos em reconhecimento a Karl Landsteiner (14/06/1868 – 26/06/1943), cientista de origem austríaca que descobriu os grupos sanguíneos, classificados no sistema A-B-O, e também o fator RH (positivo ou negativo).

Antes dessa importantíssima descoberta, as transfusões de sangue às vezes funcionavam, às vezes não, e ninguém sabia por quê. Então, se hoje você pode receber uma transfusão de sangue com segurança se precisar, isso se deve a Karl Landsteiner, nada menos que um Nobel de medicina que também contribuiu para a identificação do vírus da poliomielite e cunhou o termo “anticorpo”, até hoje usado na ciência, agora conhecidíssimo nesses tempos de pandemia.

E, por falar em pandemia, os reflexos da crise de saúde que estamos vivendo podem ser sentidos não só na economia, em função da paralisação comercial e dos negócios, e na vulnerabilidade psicológica das pessoas, por causa da perda de entes queridos e do isolamento social: os estoques dos bancos de sangue das cidades brasileiras também têm estado alarmantemente baixos, independente do fato de que a doação, respeitadas certas condições* e todos os protocolos de segurança contra a covid-19, não coloca em risco o doador.

Assim como outras causas nobres que merecem atenção o ano inteiro, a doação de sangue tem um mês específico do ano dedicado a ela para que possa ter mais visibilidade, a fim de provocar mais mobilização. É uma forma publicitária, legítima, de enfatizar o tema e estimular a doação, aumentando a base de doadores e por vezes “reativando” doadores assíduos que por vários motivos param de doar – inclusive, neste momento, talvez por causa da pandemia.

Se você tem algum tipo de ascendência ou liderança sobre um grupo de pessoas – colaboradores de uma empresa, por exemplo – estimular a doação de sangue é uma boa, e desejável, e necessária, e nobre, forma de gerar engajamento. É uma estratégia de ganha-ganha: a empresa demonstra consciência e responsabilidade social e os pacientes graves, que podem estar internados por diversos motivos, recebem o sangue de que precisam. Quem sabe você mesmo não decide doar?

Poucas coisas têm tanto poder de mobilização, e são tão compensadoras em termos humanos, quanto a generosidade.

* Estar em boas condições de saúde; ter se alimentado pelo menos 3 horas antes da doação; ter idade entre 16 e 69 anos; pesar mais de 50kg; ter dormido ao menos 4 horas no dia da doação e se apresentar descansado.

Fontes:
www.oswaldocruz.com
www.tjdft.jus.br
www.laboratoriobehring.com.br


Mãe e bebê juntos, mesmo em tempos de covid?

Mãe e bebê juntos, mesmo em tempos de covid?
Os dados sugerem que a separação é pior que a infecção.

Está cientificamente comprovado, por estudos e pela prática médica, que o contato pele a pele é indispensável para o desenvolvimento dos recém-nascidos, especialmente os prematuros.

Esse conhecimento levou ao desenvolvimento de um método a princípio chamado de mãe-canguru, depois rebatizado simplesmente de canguru, por ter sido estendido aos homens: descobriu-se que o contato do bebê com a pele do pai também favorece o desenvolvimento da criança. Entre os bebês prematuros ou abaixo do peso ideal, o método reduz as mortes em até 40% e as infecções graves em 65%, além de outros benefícios.

Mas em tempos de pandemia, quando grande parte dos contatos pode representar uma ameaça de contágio em potencial, essa proximidade física vem sendo posta em xeque por orientações de autoridades e comportamentos de parte dos profissionais de saúde, muito provavelmente de forma equivocada.

Segundo pesquisa da OMS, em muitos países – principalmente os mais pobres, que têm maior número de prematuros – os recém-nascidos estão sendo separados das mães se houver suspeita ou confirmação de que elas têm covid-19, o que aumenta (e não diminui) o risco de morte dos bebês e complicações de saúde ao longo da vida.

O órgão da ONU afirma que até 125 mil vidas poderiam ser salvas se não houvesse interrupções nesses cuidados e recomenda que as mães continuem dividindo o quarto com seus bebês, amamentando-os e praticando o contato pele a pele, mesmo quando houver suspeita ou confirmação de infecções por covid-19.

Isso porque vários estudos demonstram que quase não existem casos de sintoma ou doença leve de covid-19 em recém-nascidos infectados, embora a infecção durante a gravidez possa aumentar as chances de um parto prematuro.

O risco de recém-nascidos contraírem o vírus resultaria em menos de 2 mil mortes, enquanto estimativas recentes indicam que 15 milhões de bebês nascem prematuros, enfrentando riscos significativos de saúde, pois as complicações relacionadas à prematuridade – incluindo deficiências, atrasos de desenvolvimento e infecções – são a principal causa de morte de recém-nascidos e crianças menores de 5 anos.

O raciocínio é que as chances de uma criança sofrer ou perder a vida em decorrência de ser fisicamente separada da mãe, especialmente em casos de prematuridade (o que é comprovado), são muito maiores do que de acontecer o mesmo por causa da infecção pela covid-19 (que até agora é uma hipótese).

Claro que a orientação e o acompanhamento médico de cada caso em particular são essenciais, porém a decisão precisa ser tomada pelo profissional de saúde em conjunto com os pais – e levando em consideração esses números e as recomendações da OMS.

Se o contato físico cuidadoso e consciente já é necessário quando somos adultos – como a própria pandemia vem demonstrando com cada vez mais força – para um bebê que por qualquer motivo veio ao mundo antes de completar a gestação ele pode ser a diferença que salva a vida.

Fonte:
https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/redacao/2021/03/16/manter-maes-e-bebes-juntosdurante-pandemiapode-salvar-mais-de-125mil.htm


Coisas que você não sabia sobre o carnaval

Quem curte e quem não curte a folia carnavalesca acaba sendo de alguma forma atingido por ela – quando ela existe e mesmo nesse ano, em que foi oficialmente cancelada.

Termos como blocos, cordões, escolas de samba, desfiles e quesitos tornam-se quase onipresentes em pautas de TV, rádio, jornais e, sim, também nas redes sociais.

Mas mesmo quem não aprecia do reinado de Momo talvez ache interessante entender um pouco mais como se organiza essa que, goste-se ou não, é uma das principais manifestações culturais do nosso país.

Concentremo-nos em dois, por assim dizer, protagonistas dessas pautas: o bloco e a escola de samba. Muita gente – quase todo mundo, talvez – não sabe qual a diferença entre ambos (embora possa intuir, baseado no que vivência).

Tratamos aqui de uma classificação fundamentada, mas um tanto informal, que não reflete por completo documentos oficiais dos poderes públicos nem das agremiações de uma coisa e de outra.

Pois bem: o bloco é uma manifestação de rua, relativamente espontânea e informalmente organizada, em que os membros geralmente (mas nem sempre) usam algum tipo de uniforme para poder ser identificados, desfilam em espaço público e cantam várias canções, que podem variar bastante de acordo com a tema adotado.

Os integrantes de um bloco podem até tocar instrumentos, o que quase nunca é obrigatório, e existem mesmo agremiações em que o principal do som vem de gravações e equipamentos eletrônicos. Além disso, com poucas exceções, o desfile tem intenção puramente recreativa, não competitiva.

Já a escola de samba, embora tenha o mesmo caráter de manifestação popular, é uma agremiação organizada, na qual existem alas, que têm fantasias específicas, e durante o desfile há uma canção oficial a ser cantada: o famoso samba-enredo, que conta uma única história, necessariamente refletida nas fantasias e carros alegóricos presentes na apresentação.

Mas talvez a principal diferença da escola de samba é que conceitualmente ela é criada em torno da bateria, na qual precisam estar incluídos, obrigatoriamente, vários tipos de instrumentos. A bateria, portanto, é elemento fundamental, constitutivo, e tem de tocar o tempo todo, com componentes têm exclusivamente essa função. Outra coisa, evidente, mas que não custa apontar: o que a bateria toca tem de ser um samba. Pois é o samba que, numa bela figura de linguagem, “irradia” a agremiação em torno de si, ideia que também se reflete na palavra “escola”. E, claro, as escolas de samba desfilam com intuito competitivo.

Nesse carnaval atípico, imposto pela pandemia, provavelmente não é o melhor momento de pensar em seguros, pessoais ou corporativos. Porque mesmo com as festas que criam aglomerações tendo sido canceladas, ou proibidas, muitos querem aproveitar esse gap quase tradicional no ano brasileiro para descansar e relaxar – ou talvez brincando de alguma forma virtual.

Por mais que haja a tentação de sair e aglomerar-se, seja na avenida ou num canto qualquer menos visado da cidade, esse ano a melhor forma de “seguro” é ficar em casa ou inventar uma forma alternativa, sem riscos, de brincar a festa.

Quando a batalha contra a covid-19 estiver vencida, aí sim, poderemos, todos, fazer folia.


Vacinar(-se) ou não durante a gestação?

Uma das maiores complicações no desenvolvimento de novos medicamentos é o binômio segurança-eficácia de um princípio ativo ainda em estudo no que se se refere a mulheres grávidas. Há substâncias que atravessam a barreira de proteção natural constituída pela placenta, chegando ao feto e podendo alterar de alguma forma seu desenvolvimento normal durante a gestação.

Mesmo quando a substância em si não age diretamente sobre o meio ambiente intrauterino, onde está o futuro bebê, se o medicamento alterar de forma significativa o funcionamento do organismo da mãe também pode haver consequências futuras – para ambos.

Evidentemente, isso não significa que mulheres grávidas não podem ou não precisam ser medicadas, mas sim que quando se trata delas é preciso ter cautela redobrada na administração de qualquer fármaco: existem diversos deles que têm segurança extensamente comprovada para gestantes, e outros tantos que não.

Dado o ineditismo da covid-19 – doença “descoberta” há pouco mais de um ano – assim como das vacinas desenvolvidas até agora para combatê-la, é mais do que esperado que surjam dúvidas sobre a indicação ou não dessas novas drogas durante a gravidez.

A posição da OMS – Organização Mundial da Saúde mudou recentemente, de forma um tanto sutil, mas relevante: se antes contraindicava claramente “devido a dados insuficientes” o uso das vacinas da Pfizer e da Moderna em gestantes, a menos que estivessem em alto risco, agora afirma não existir até o momento  nenhuma razão para acreditar que há riscos específicos que superem os benefícios da vacinação nestes casos. A orientação não muda no que se refere ao perfil de risco da paciente e à óbvia necessidade de discussão com seu médico.

É bom que se diga que a OMS erra, e desde o início da pandemia muitos especialistas em saúde acusaram o órgão internacional de equívocos que podem ter comprometido a saúde – e a vida – de milhões de pessoas no mundo todo. Claro que não se pode ignorar completamente suas orientações, mas também não parece recomendável tomá-las como verdades científicas absolutas.

Os fatos até o momento são os seguintes: nenhuma das vacinas já disponíveis hoje – inclusive a CoronaVac, do Instituto Butantan, não citada especificamente pela OMS – envolveu a realização de testes clínicos ou estudos controlados em mulheres grávidas, exatamente pela complexidade da tarefa, inclusive no que se refere a questões éticas.

A vacina da Oxford-Astrazeneca até traz na bula brasileira uma clara contra-recomendação: “Como uma medida de precaução, a vacinação com a vacina covid-19 (recombinante) não é recomendada durante a gravidez”, devendo o uso “ser baseado em uma avaliação se os benefícios da vacinação superam os riscos potenciais”.

É muito provável que estudos futuros, talvez muito em breve, já contemplem esse perfil específico de paciente, mas até chegar lá como se decidir pela vacinação ou não durante gestação?

A ausência de uma resposta exata, uma certeza científica, é tanto frustrante como talvez o caminho para a única resposta possível no presente (que, aliás, pode ser estendida para praticamente qualquer medicamento): a avaliação criteriosa, rigorosa, discutida e acompanhada de perto por um médico confiável, competente e atualizado, seguida de uma decisão consciente e conjunta baseada no custo-benefício para a paciente (já insinuado acima).

O tema é muito delicado e sério – como o momento que estamos vivendo – e soa bastante realista dizer que muitas decisões das mais importantes da nossa vida não são tomadas com tanta serenidade e sensatez.